HOJE, AO TOMAR DE VEZ A DECISÃO DE SER EU
Hoje, ao tomar de vez a decisão de ser Eu, de viver à altura do meu mister,(...) reentrei de vez, de volta da minha viagem de impressões pelos outros, na posse plena do meu Génio e na divina consciência da minha Missão. Hoje só me quero tal qual meu carácter nato quer que eu seja; e meu Génio, com ele nascido, me impõe que eu não deixe de ser. Atitude por atitude, melhor a mais nobre, a mais alta e a mais calma. Pose por pose, a pose de ser o que sou. Nada de desafios à plebe, nada de girândolas para o riso ou a raiva dos inferiores. A superioridade não se mascara de palhaço; é de renúncia e de silêncio que se veste. O último rasto de influência dos outros no meu carácter cessou com isto.
(...) Um raio hoje deslumbrou-me de lucidez. Nasci.
21-11-1914, Páginas Íntimas e de Auto-Interpretação. Fernando Pessoa. (Textos estabelecidos por Georg Rudolf Lind e Jacinto do Prado Coelho.) Lisboa: Ática, 1966: 63. Versão completa disponível em Arquivo Pessoa